sábado, 8 de dezembro de 2012

A lei de «identidade de género» e os limites
da omnipotência do legislador (1)

Pedro Vaz Patto

No momento em que escrevo [2010], está em discussão numa comissão da Assembleia da República o Projecto de Lei nº 319/XI, do Bloco de Esquerda, que «altera o Código de Registo Civil, permitindo a pessoas transexuais a mudança de registo do sexo no assento de nascimento»[1]. De acordo com este Projecto, bastará, para tal mudança, essencialmente, a apresentação de documento médico comprovativo de que a pessoa em causa vive, há pelo menos dois anos, no «sexo social desejado», ou que tenha estado, há pelo menos um ano, em tratamentos hormonais com vista ao ajustamento das suas características físicas às «do sexo em que vive» (artigo 3º). Pretende-se que fiquem essas pessoas dispensadas de (como tem sucedido até aqui) recorrer aos tribunais só quando se tenha concretizado, através de operação cirúrgica, essa mudança de características físicas (com todas as delongas daqui decorrentes) para obter tal mudança de registo[2]. Esta mudança poderá, pois, ser obtida por via administrativa sem que se tenha concretizado qualquer mudança de características físicas. 
Com os mesmos objectivos, foi, entretanto, apresentada, pelo Governo, na Assembleia da República a Proposta de Lei nº 37/XI[3], que «cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à 18º alteração do Código de Registo Civil». Para essa mudança, de acordo com esta Proposta, bastará, essencialmente, a apresentação de «relatório elaborado por equipa clínica multidisciplinar de sexologia clínica, em estabelecimento de saúde público ou privado, nacional ou estrangeiro, que comprove o diagnóstico de perturbação de identidade de género», também designado como transexualidade (artigos 1º, nº 1, e 3º, b)). 
Estes dois diplomas seguem a orientação das chamadas «leis de identidade de género», de que é exemplo a Lei espanhola (Ley nº 3/2007). Este diploma, referido como modelo na exposição de motivos de ambos os diplomas, foi aprovado na sequência e na linha da aprovação da alteração, em 2004, da definição legal de casamento no Código Civil espanhol de modo a nela incluir casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Os passos que os proponentes dos diplomas em causa pretendem seguir são, pois, decalcados, da experiência espanhola. 
Além da legislação espanhola, outras têm introduzido esta inovação. Assim, a Transgendergesetz alemã de 2000, o Gender Recognition Act britânico de 2004 e a Lei argentina de 2008. A Lei italiana n. 164, de 14 de Abril de 1982, em vigor (também referida na exposição de motivos da Proposta de Lei em apreço), exige, pelo contrário, uma operação cirúrgica irreversível para que seja admissível a mudança de registo oficial do sexo de uma pessoa. 
Numa primeira apreciação, poderá dizer-se que a mudança do registo oficial do sexo de uma pessoa, de modo a corresponder ao seu «sexo social desejado», nenhuma perturbação causará a outras ou à sociedade em geral. Argumentação semelhante também se ouviu a respeito da discussão sobre a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo (com essa legalização nenhum casal heterossexual ficaria privado de direitos). Nesse caso, porém, estava em causa a definição legal de uma instituição matricial e de referência sem paralelo, com tudo o que isso implica no plano cultural; não pode dizer-se que isso não afectará a sociedade em geral. Neste caso, não está em causa uma instituição com a relevância social do casamento, nem o reconhecimento e protecção desta no plano cultural. 
É manifesto o exagero em que incorrem os proponentes de alterações legislativas como esta quando quase parecem sustentar que a mudança do registo oficial do sexo pode condicionar o exercício de direitos como os de acesso à saúde, à habitação ou ao trabalho (a exposição de motivos do Projecto de Lei referido também cai nesse exagero). Quando a ordem jurídica não consagra discriminações em função do sexo, é óbvio que o exercício de algum desses direitos não dependerá nunca de alguma mudança do registo oficial do sexo. O que se verificará é, antes, a perturbação e a humilhação (sim, devemos reconhecê-lo) próprias de quem se vê forçado a, no exercício desses e de outros direitos, evidenciar a desconformidade entre o registo oficial do seu sexo e o seu «sexo social desejado» ou o «sexo em que vive»,para usar as expressões desse Projecto de Lei. 
A situação destas pessoas, e o seu sofrimento, não podem deixar de merecer consideração. Mas não me parece que sejam alterações jurídicas como esta que façam desaparecer esse sofrimento. E, sobretudo, não me parece que, para isso, se possa aceitar uma subversão do papel do legislador em relação ao que é a realidade e a verdade das coisas. Sobre a questão da transexualidade em geral, faltam-me os conhecimentos científicos necessários para uma análise aprofundada. Por isso, não me deterei nela. Sobre o papel do legislador, gostaria de tecer algumas considerações um pouco mais desenvolvidas. 
Não é por acaso que as leis «de identidade de género» surgem na sequência ou em estreita ligação com a redefinição legal do casamento de modo a nela incluir casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Estamos perante uma agenda de afirmação ideológica. Está em causa a afirmação da chamada ideologia do género (gender theory) e a sua tradução no plano legislativo. O que é, desde logo, questionável é a legitimidade da redução da Lei a instrumento de afirmação ideológica. Estamos perante uma verdadeira «revolução cultural» que vem de cima, das instâncias políticas e legislativas, e não surge espontaneamente da sociedade civil e da mentalidade corrente. Pretende-se transformar através da política e do direito essa mentalidade. Este tipo de objectivo é tendencialmente totalitário E o que está em causa não é um aspecto secundário, mas referências culturais fundamentais relativas à relevância da dualidade sexual. 
Em paralelo com estas alterações legislativas assistimos à transformação dos hábitos linguísticos (a lembrar a «novilíngua» de Orwell): em documentos oficiais e no nome de instituições oficiais (como a «Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género», por exemplo) deixou de falar-se em «igualdade entre homens e mulheres» e passou a falar-se em «igualdade de género», sem que muitas das pessoas que passaram a usar esta expressão por uma questão de «moda» sequer se apercebam da sua conotação ideológica. 
E também o sistema de ensino, como o sistema jurídico, serve de instrumento de afirmação ideológica (também esta uma tendência de tipo totalitário). Assim, por exemplo, a Portaria nº 196-A/2010, de 9 de Abril, que regulamenta a Lei nº 60/2009, de 6 de Agosto, relativa à educação sexual em meio escolar, inclui, entre os conteúdos a abordar neste âmbito e no 2º ciclo (5º e 6º anos) «sexualidade e género». Em Espanha, a instrumentalização do ensino, através da disciplina de «Educação para a Cidadania», no sentido da difusão da ideologia de género, que também se seguiu à legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, tem suscitado um vasto movimento de recusa de frequência com invocação da objecção de consciência por parte de muitos encarregados de educação que sentem violados os seus direitos. 
Gabriele Kuby exprime deste modo o alcance da transformação de mentalidades em questão: «Porque a palavra cria a realidade, as mudanças sociais caminham sempre a par e passo com a mudança da língua. (…) Existe também um novo termo, útil para extrapolar a sexualidade da polaridade de homem e mulher e para a submeter à livre disponibilidade do indivíduo: o termo é gender. Por ele se entende o sexo «social», arbitrariamente seleccionável, diferente daquilo que distingue sexualmente o homem da mulher. Num contexto popular a ideia de gender nasceu há pouco tempo e, todavia, representa a ponta de diamante da revolução relativista»[4]. 
[1] Acessível em www.parlamento.pt. 
[2] Como se refere na exposição de motivos do Projecto, a jurisprudência tem considerado até aqui (designadamente nos acórdãos da Relação de Lisboa de 9 de Novembro de 1993 e de 22 de Junho de 2004 aí citados) que na situação de mudança de características físicas se verifica uma lacuna na legislação em vigor e que, de acordo com as regras de integração de lacunas decorrentes do artigo 10º do Código Civil, essa lacuna deve ser superada através da aplicação da norma que o legislador criaria se considerasse a situação. Essa norma admitiria a mudança de sexo à luz do direito constitucional à identidade pessoal (artigo 26º, nº 1, da Constituição), a qual abrange a identidade sexual. 
[3] Acessível em www.parlamento.pt. 
[4] Gender Revolution, Ilrelativismo in azione, (tradução italiana), Edizioni Cantagalli, Siena, 2008, p. 27
 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

O medo de Salazar…

João Brandão Ferreira

«Pai, perdoa-lhes que eles não sabem o que fazem».
Jesus Cristo
O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), dependente do Ministério da Justiça, decidiu não autorizar o rótulo «Memórias de Salazar» com que o Município de Santa Comba Dão pretendia comercializar algum vinho da região.
Não sei se os promotores da iniciativa têm algum desígnio político/ideológico subjacente à mesma ou, apenas, pretendem fazer comércio e, ou, promover a terra, etc. A eles caberá elucidar.
Seja o que fôr parece um direito normalíssimo num regime político e numa sociedade que se afirma da mais pura Democracia – mas que deixa, afinal, muito a desejar quanto à prática.
O que é pasmoso, porém, é a argumentação vertida como justificação (note-se que não se invocou qualquer impedimento legal), atente-se: «Podia ofender a consciência colectiva e fazer perigar a ordem pública».
Ou seja os senhores do INPI arvoraram-se em censores, lavraram um estatuto de menoridade mental e cívica, à população e, pelo meio, ainda passaram um atestado de incompetência às Forças de Segurança.
Partindo do princípio de que não actuaram como correias de transmissão de poderes fácticos, mas apenas em função da sua consciência, vamos tentar provar que se devem preocupar melhor com esta do que com aquela, a que apelidam de colectiva e de que se confessam estrénuos preocupados e defensores.
Não sabemos em que estudos de opinião se basearam para opinarem sobre os perigos que impendem sobre a tal «consciência colectiva» mas, porventura, um dia nos queiram elucidar.
Meditem bem, pois se a moda pega poucos dos políticos contemporâneos vão poder, futuramente, ter o seu nome em qualquer rótulo e anúncio que se invente!…
 
Não sei até onde irão os escrúpulos persecutórios do INPI, mas receio que possam lembrar-se de instigar a tutela a proibir a venda de qualquer objecto que lembre o «feroz ditador», quer seja na Feira da Ladra ou no mais respeitável antiquário ou, quiçá, a criminalizar quem tenha em casa, sei lá, um busto ou uma foto de tão perigosa personagem.
 
Sugiro, por outro lado, que recomendem à Sociedade Portuguesa de Autores para que qualquer livro ou filme sobre o… (eu já nem me atrevo a dizer o nome!), não escancare a carantonha ou o apelido de quem tratamos.
 
Iria, até, mais longe: desaconselharia vivamente, sob ameaça de penas eternas, que qualquer historiador – a não ser aqueles formados na escola do Dr. Rosas – investigue sobre o dito cujo.
 
Finalmente a Conferência Episcopal recomendaria a todos os oficiantes da Santa Missa, que usassem de uma qualquer fórmula que substituísse o nome do mais ilustre nascido no Vimioso, aquando das raras missas rezadas em sufrágio da sua alma (o Sr. Bispo D. Januário estaria, obviamente, dispensado desta fraternidade apostólica).
 
Coerência oblige!
 
Se o ridículo e a falta de vergonha matassem, esta gente caía fulminada. Mas estão vivos e recomendam-se.
 
Faltas de vergonha têm-na em abundância, pois quando se permitem estes despautérios, convivem alegremente, por ex., com a invasão de T-Shirts (e outra memorália), com que se revestiu o peito de muita da juventude do «Ocidente» com a figura do Che Guevara – um psicopata ideológico que assassinou, directa e indirectamente, milhares de pessoas, transfigurado em ícone libertário!
 
Estranho, outrossim, que o INPI não se moleste com a enorme estátua do Marquês de Pombal, que mandou trucidar os Távoras e o Duque de Aveiro, num espectáculo bárbaro que horrorizou as elites europeias de então.
 
Como facilmente podem constatar todos os dias passam por lá milhares de pessoas e não há notícia de anomalias na consciência colectiva, nem existem polícias a guardá-la.
 
E certamente ainda não repararam que a estátua encima a maior avenida de Lisboa, que se chama «da Liberdade», quando o Marquês encarna, entre nós, o «Despotismo Esclarecido»…
 
Algo de semelhante se passa com a estátua de estadão com que se agraciou D. Pedro IV, no Rossio (parece que representa o Maximiliano I, do México, mas isso entra no capitulo que refere «escrever Deus direito, por linhas tortas»).
 
Ora, Pedro de Bragança, enquanto Príncipe Herdeiro, traíu o Rei (que, por acaso, era seu pai) e a Nação, ao revoltar-se e consumar a secessão do Brasil, que era a maior parcela do território nacional.
 
Passados uns anos e muitos milhares de mortos e outras desgraças, depois, veio a ser coroado Rei de Portugal e lá está na sua estátua, sem que a consciência colectiva (e os pombos) sofra minimamente com isso.
 
E se estão tão preocupados com «decência» – presumo que seja disso que se trata – porque não se empolgam contra o triste espectáculo da homenagem feita pelo PCP, no último congresso, à memória de Álvaro Cunhal, um estalinista ferrenho que, durante décadas, andou a defender os interesses de uma potência estrangeira, a URSS, inimiga figadal do nosso país?
 
E chamam-lhe «patriota» e «defensor dos trabalhadores»?
 
Como se atrevem ao despudor de falarem, agora, em Independência Nacional quando se referem à «Troika»?
 
Há por aí algum Partido que queira homenagear o Cristóvão de Moura e o Miguel de Vasconcelos?
 
E por falar em consciência (ou moral) colectiva, digam lá óh senhores do INPI, se espreitarem uma sessão da Assembleia da República e outra da «Casa dos Segredos», às vezes não sentem dúvidas sobre qual é qual?
 
Numa época de desenfreado «Relativismo Moral», desnorte político e corrupção infrene, aquilo que mais vos preocupa é um rótulo com a palavra «Salazar»?
 
V. Excelências não se enxergam, pois não?
 
*****
 
Bom, vamos partir do princípio, que cremos correcto, de que não se deve dar dignidade pública a quem não a merece por uma questão de higiene cívica e moral.
 
A avaliar pelo que se disse e fez à figura de Salazar, o homem deve habitar no mais profundo dos infernos!
 
Retiraram o seu nome de ruas e praças; apearam-lhe as estátuas (quando não as destruíram à bomba – isto sim, um problema de ordem pública), mudaram cavilosamente o nome de uma ponte que mandara construir (e que ele, na sua sabedoria, previu), chamando-lhe 25/4 – quando foi inaugurada a 6/8 – assassinaram-no politica e moralmente; apostrofaram-no no discurso público e nos livros da Escola, enterrando-o na mais vil das valas comuns.
 
Não contentes com tudo isto até querem riscar o seu nome dos rótulos do vinho, de que ele, por sinal, foi um pequeno produtor! Será que entrámos no reino da paranoia?
 
Não deixa de ser estranho, tudo isto – e aqui sim, entra a consciência colectiva – quando ele foi um homem de origem humilde, que subiu a pulso, sem gozar do favor de ninguém e ter chegado ao Poder sem lutar por ele, mas a pedido de outrem.
 
Saneou as finanças em menos de dois anos (sem ajuda do FMI nem do BCE) e equilibrou o orçamento durante 40 anos, garantindo uma das moedas mais fortes e respeitadas do mundo e acumulando enormes reservas de ouro e divisas.
 
Recebeu um país falido, moralmente esfrangalhado, em guerra civil permanente (entre 1921 e 1925 rebentaram, só em Lisboa, 325 bombas)[1] – herança de 90 anos de liberalismo falhado e 16 anos de republicanismo jacobino, serôdio, absolutamente pavorosos – e, em poucos anos tirou a Nação da lama e o Estado da sarjeta, em que se encontravam. E quando por esse mundo fora, se empregava o termo «portugalizar» com um significado dos mais infamantes!
 
Que lavagem ao cérebro foi feita à população para se ter chegado à falta de consciência histórica actual?!
 
Como se pode compreender e aceitar tanto desvario mental e cobardia moral?
 
*****
 
Porque será, então, que um governante que nunca perdeu uma batalha política em toda a sua vida - excepção feita para a perda inestimável dos sagrados territórios de Goa, Damão e Diu, que só não se podem considerar cativos da escabrosa invasão da União Indiana, em 18/12/1961, porque um desvairado governo português a reconheceu «de Jure», em 1975 – ganhou, aparentemente, tanta inimizade e ódio?
 
Vejamos, em termos pessoais:
 
Ele roubava? Era pedófilo? Batia na governanta (já que nunca casou)? Drogava-se? Embriagava-se? Esteve envolvido nalgum escândalo? Mentia? Tinha outros vícios? Era corrupto? Cobarde? Formou-se ao domingo?
 
Posta a questão ao contrário, conhece-se algum aleijão moral, que colidisse com os 10 Mandamentos da Lei de Deus ou com a lisura com que nos devemos comportar em sociedade?
 
Em termos políticos:
 
Foi incompetente? Não defendeu sempre a individualidade e identidade de Portugal? Traíu o seu País? Desertou de algum combate? Não defendeu sempre os interesses portugueses sem tergiversar, e só esses? Deixou que algum país ou instituição tivesse afrontado Portugal e ficasse sem resposta?
 
Mandou matar alguém? (Não venham com essa do Delgado, pois não há provas nem é crível); Quis entregar o país a organizações secretas internacionalistas? Havia algum organismo do Estado que não pagasse a horas? Algum se endividou?
 
Não dava o exemplo? Acaso dizia uma coisa hoje e outra diferente, no dia seguinte, com o maior dos à-vontades? Fez promessas que não cumpriu? Lembram-se de alguma gaffe pública? Desbaratou alguma vez os dinheiros públicos? Inventou alguma «PPP»? Nacionalizou algum banco – e respectivo buraco financeiro - com o dinheiro dos contribuintes?
 
Não desenvolveu lenta, mas sustentadamente, todo o país?
 
Não melhorou a Indústria, o Comércio, a Agricultura, a Pesca, as Minas, a Marinha Mercante, as Forças Armadas, as Artes, a Educação, a Justiça, enfim, todos os sectores da vida nacional, tanto na Metrópole como no Ultramar? (Foi pouco, dizem, digamos que foi parcimonioso e equilibrado, gastando o que se podia com a riqueza criada e sem estar enfeudado ou dependente de ninguém!).
 
A lista podia continuar.
 
De que se acusa então, o excelente e sério, Professor de Coimbra, de uma integridade rara e à prova de bala, que se alcandorou à categoria de estadista de nível internacional chegando a ser apelidado de «Le sage de l’ Occident»?[2]
 
Pois acusa-se o Homem de não ser «democrata»! Coisa que ele, aliás, sempre assumiu e nunca contestou.
 
Mas também parece que D. João II foi um excelente Rei e não consta que tenha sido democrata…
 
E, já agora, desde quando é que ser «democrata» é garantia de se ser bom em seja o que for?
 
Bem lhe chamou, José Hermano Saraiva, na sua derradeira entrevista televisiva, de «Ditador Santo». Opinião de certo modo corroborada por seu irmão António – um reconhecido e respeitado intelectual - e arrependido comunista – que disse de Salazar, e cito: «Salazar foi, sem dúvida, um dos homens mais notáveis da História de Portugal e possuía uma qualidade que os homens notáveis nem sempre possuem: a recta intenção».[3]
 
Creio que esta foi, até hoje, a mais conseguida síntese sobre Salazar.
 
Por tudo o que se disse e o muito que ficou por dizer, se pode concluir que a campanha constante e doentia, da maioria dos círculos políticos e mediáticos, contra o «Botas», como depreciativamente lhe chamam – vejam que até aproveitam a sua parcimónia económica no calçar, para o tentarem desprestigiar – apenas reflete um incontrolável medo e pavor por alguém que jaz em campa rasa, por sua vontade, há 44 anos.
 
Medo e pavor da sua memória e exemplo, que não conseguem apagar e desmerecer.
 
Não lhes chegam aos calcanhares e sabem disso.
 
E muitos têm ainda, medo e pavor de que o rol extenso de crimes, traições, incompetências, sujidades morais e alarvidades várias, que cometeram – tudo, aliás, em nome dos princípios democráticos, sempre invocados – apareçam cada vez mais recortados como condenáveis, obscuros e mesquinhos face à luz que emana da obra de um «ditador».
 
Parafraseando o Cristo, «Pai tem cuidado ao perdoar-lhes, pois eles sabem bem o que fizeram e continuam a fazer»…


PS. Se quiser mostrar a sua indignação e o ridiculo envie email para o INPI atm@inpi.pt
 
 [1] Ver relatório do Comandante da PSP de Lisboa, em 1925, Coronel Ferreira do Amaral.

[2] «O sábio do Ocidente». Ver Boletim Geral do Ultramar, Ano 41, nº 482 (Ago. 1965), p.27-35.

[3] Semanário «Expresso», de 12/04/1989
 

Eslováquia resiste e não retira auréolas
dos santos Cirilo e Metódio impressas nas moedas

Dos jornais

Resistindo à pressão da Comissão Europeia, o Banco Nacional da Eslováquia e a maioria da oposição, a Eslováquia votou para que se mantenha o desenho original da moeda comemorativa da evangelização da Grande Morávia pelos dois irmãos e santos Cirilo e Metódio, grandes evangelizadores e construtores da cultura dos países eslavos.

Em 2013 a Eslováquia celebrará um grande jubileu pelo 1 150.º aniversário do início da missão na Grande Morávia dos santos e irmãos, Cirilo e Metódio.

Por esta razão, em Maio de 2012, o Banco Nacional Eslovaco (NBS), anunciou um concurso público para o desenho da moeda comemorativa de 2 euros. Um total de 22 desenhos de 13 artistas foram admitidos e o resultado foi divulgado em Junho pelo Comité de Governo do NBS para a avaliação dos desenhos das moedas do euro da Eslováquia.

O primeiro prémio foi dado a Miroslav Hric. O seu desenho representa os dois santos e entre ambos, em primeiro plano, uma dupla cruz – símbolo da Eslováquia –, que representa a importância da sua missão, que ajudou a assegurar a plena soberania e legitimidade da região da Grande Morávia como o primeiro Estado eslavo no centro da Europa.

A figura de São Cirilo levando um livro simboliza a educação e a Fé, enquanto que São Metódio aparece junto a uma igreja que simboliza a Fé e a Cristandade institucional.

Entretanto, o desenho original estava para ser modificado retirando as auréolas de santidade das suas cabeças e as cruzes das suas túnicas porque a Comissão Europeia e «alguns países» pediram à Eslováquia «para eliminar alguns símbolos da moeda para cumprir com o princípio de neutralidade religiosa».

Ao tomar conhecimento desta censura a Conferência Episcopal da Eslováquia emitiu um comunicado no qual não hesitou em utilizar a palavra «vergonha»: «a renúncia dos atributos chave relacionados conceitualmente com os santos Cirilo e Metódio, demonstra a falta de respeito pela tradição cristã na Europa», comentou indignado o padre Jozef Kovaczik, porta-voz da Igreja da Eslováquia.

O comunicado acrescentou que a Igreja da Eslováquia ficou a saber da retirada dos símbolos cristãos das moedas de 2 euros através dos meios de comunicação.

«Em 1988, antes da 'Revolução de Veludo', os fiéis da Eslováquia arriscaram as suas vidas, pregando a doutrina dos dois santos. Realmente vivemos num estado de direito, ou num sistema totalitário, que nos dita que atributos podemos utilizar», afirmava o sacerdote asseverando que a Eslováquia é um país católico.

Os santos Cirilo e Metódio são os evangelizadores do mundo eslavo e são além disso considerados «isoapóstolos» pelos cristãos ortodoxos. O Beato João Paulo II nomeou-os Co-Padroeiros da Europa em 1980. Foram também o sinal visível da união de toda a Igreja, Oriente e Ocidente.

Os santos inventaram o alfabeto glagolítico (cirílico) para traduzir a Bíblia e convertê-la num grande meio de evangelização. É por causa de São Cirilo que o alfabeto que usam algumas línguas eslavas, tem este nome.
 

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O homem de hoje é considerado apenas
na perspectiva biológica, alerta o Papa

Dos jornais

O Papa Bento XVI disse que o homem de hoje é considerado apenas em chave biológica, como se fosse um mero «capital humano» ou «recurso» de uma «engrenagem produtiva ou financeira» devido à indiferença à relação mais importante do ser humano: a relação com Deus.
Assim referiu o Santo Padre esta manhã no seu discurso aos participantes da assembleia plenária do Pontifício Conselho Justiça e Paz. Nele o Papa afirmou que «embora a defesa dos direitos tenha feito grandes progressos no nosso tempo, a cultura de hoje, caracterizada, entre outros, por um individualismo utilitarista e um economicismo tecnocrático, tende a desvalorizar a pessoa».
«Isto vem concebido como um ser ‘fluído’, sem consistência permanente. Apesar de estar imerso numa rede infinita de relações e de comunicações, o homem de hoje paradoxalmente parece sempre um ser isolado, porque indiferente a respeito da relação constitutiva do seu ser, que é a raiz de todos os outros relacionamentos, a relação com Deus».
O Papa denunciou logo que «o homem de hoje é considerado chave predominantemente biológica ou como ‘capital humano’, ‘recurso’, parte de um sistema produtivo e financeiro que o domina».
«Se, por um lado, se continua a proclamar a dignidade da pessoa humana, por outro, novas ideologias – como aquela hedonística e egoísta dos direitos sexuais e reprodutivos ou aquela de um capitalismo financeiro desregulado que prevalece na política e desconstrói a economia real – contribuem para considerar o trabalhador e o seu trabalho como bens ‘menores’ e a minar os fundamentos naturais da sociedade, especialmente a família».
O Santo Padre afirmou ademais que «na realidade, o ser humano, constitutivamente transcendente a respeito dos outros seres e bens terrenos, tem uma liderança real que o coloca como responsável de si mesmo e da criação. Concretamente, pelo Cristianismo, o trabalho é um bem fundamental para o homem em vista da sua personalização, da sua socialização, da formação de uma família, a contribuição para o bem comum e para a paz».
«Por isso mesmo, o objectivo do acesso ao trabalho para todos é sempre prioritário, também nos períodos de recessão económica», acrescentou.
«A partir de uma nova evangelização da sociedade pode derivar um novo humanismo e um renovado empenho cultural e projectivo. Esta ajuda a destronar os ídolos modernos, para substituir o individualismo, o consumismo materialista e a tecnocracia, com a cultura da fraternidade, da gratuidade e do amor solidário», disse.
«Jesus Cristo resumiu e cumpriu os preceitos de um novo mandamento: ‘Como eu vos amei, assim amais também vós uns aos outros»; aqui está o segredo de cada vida social plenamente humana e pacífica, e da renovação da política e das instituições nacionais e mundiais. O beato Papa João XXIII motivou o empenho para a construção de uma comunidade mundial, com uma correspondente autoridade, movendo-se pelo amor, e precisamente o amor para o bem comum da família humana», recordou o Pontífice.
«Assim lemos na Pacem in terris: ‘Existe uma relação entre os conteúdos históricos do bem comum de um lado e a configuração dos Poderes públicos do outro’. A ordem moral, isto é, como exige a autoridade pública na convivência para a implementação do bem comum, por consequência exige também que a autoridade para tal campo seja eficiente».
A Igreja, precisou o Papa Bento, «certamente não tem a tarefa de sugerir, do ponto de vista jurídico e político, a configuração concreta de uma tal ordem internacional, mas oferece a quem tem a responsabilidade por esses princípios de reflexão, critérios de julgamento e orientações práticas que possam garantir o quadro antropológico e ético em torno do bem comum».
«Na reflexão, no entanto, deve-se ter em mente que não se deve imaginar um superpoder, concentrado nas mãos de poucos, que dominaria sobre todos os povos, tirando proveito dos mais fracos, mas que toda a autoridade deve ser entendida, antes de tudo, como força moral, faculdade de influir segundo a razão, isto é, como autoridade de propriedade, limitada pela competência e pelo direito», concluiu o Pontífice.
 

Será que a «descolonização» chegou à Europa?


João J. Brandão Ferreira

Depois da queda do Muro de Berlim, em 1989, a URSS implodiu e, num curto espaço de tempo, teve que dar a independência (apesar de, nalguns casos, a mesma ser mais formal do que real) a várias «Repúblicas» do seu vasto império, agregadas a ferro e fogo, à medida que os eslavos russos foram cavalgando as estepes.
Durante muitas décadas o governo soviético andou a espalhar guerras pelo mundo, que apelidou de «libertação» na mira e em nome do «internacionalismo proletário» e na lógica da «Guerra Fria». Ao mesmo tempo que mantinha a sua bota imperialista sobre a Europa Oriental.
Nunca lhe ocorreu questionar – nem a muitos outros, nomeadamente os que atacavam Portugal – se o que faziam aos povos contíguos, não seria colonialismo, ou até pior!
Será que foi por eles terem ido a cavalo e os europeus de navio?
Livres dos russos e com o comunismo desacreditado logo rebentaram os nacionalismos na Jugoslávia. Esquecidos os europeus que os Balcãs são a região mais fracturada e fracturante do velho continente, logo as principais potências ajudaram ao desmembramento daquele país, sendo os objectivos díspares.
Nesta acção destacou-se a Alemanha que espoletou, verdadeiramente, a guerra por aquelas paragens ao reconhecer a Eslovénia, sem ter dado cavaco à UE e à NATO.
Os EUA escavacaram o resto sem querer saber das consequências para os europeus, muito menos para as populações da área.
Voltaram a arranjar um inimigo para a NATO – que estava num impasse sem saber que uso dar aos meios de que dispunha – e inventaram um Kosovo independente à revelia de qualquer senso político. Afinal aquilo é o «quintal das traseiras» da Europa, eles que se desengomem!...
A Espanha, na previsão do contágio que semelhante exemplo podia ter no mal-amanhado (mas muito democrático) xadrez autonómico, que engendraram, logo se apressou a não reconhecer tal independência.
A época pós Tejero Molina abandalhou muito a Espanha mas, em Madrid, ainda há quem se lembre que foi capital dos Habsburgo
O exemplo frutificou: a seguir veio a Checoslováquia que se separou pacificamente pois não tinha razões para ser de outro modo, dado as duas partes serem homogéneas e equivalentes e estarem coladas com cuspo.
E começaram a afirmar-se nacionalismos na Escócia, Córsega, Norte de Itália e os já clássicos País Basco e Irlanda do Norte. Outros espreitam.
Isto claro, para já não falar na Bélgica que é um país artificial, que esteve, há pouco, mais de um ano sem governo e que, aparentemente, só se aguenta por ter no seu solo as sedes da NATO e da UE…
Reveja-se a evolução do mapa político europeu ao longo dos últimos mil anos e verão que a única fronteira que não mexe é a portuguesa, desde 1297, salvo os 741 km2 referentes a Olivença e seu termo, ilegalmente ocupadas por Espanha, desde 1807, seguramente, desde 1815. Coisa de somenos, certamente, já que não incomoda as almas lusas, à excepção de meia dúzia de «patriotas», termo que virou dos mais infamantes…
Mas até do outro lado do Atlântico pode vir a haver problemas.
Os norte-americanos depois de terem atravessado rapidamente o continente até ao Pacífico, chacinando os bisontes e os índios, fizeram um novo país, metendo os indígenas sobreviventes em reservas e conservando a mão-de-obra escrava vinda de África.
Quando se viram livres dos «Casacas Vermelhas» e retiveram os impostos só para si, decidiram que também não queriam mais soberanias europeias no «seu» continente e vá de ajudar a correr com eles.
Depois pensaram que aquelas terras por onde tinham colonizado portugueses e espanhóis, faziam jeito e logo promoveram a política da canhoneira, à mistura com a doutrina isolacionista de Monroe, de 1828. O ponto crucial desta estratégia ocorreu em 1898, com a guerra miserável que fizeram à Espanha, em Cuba e …… nas Filipinas.
O resto também é conhecido.
Na segunda metade do século XIX as coisas correram de tal modo mal, que degeneraram em guerra civil entre 1861–1865, entre o Norte industrializado e o Sul rural, que se queria separar da União e cuja fricção maior se deveu à emancipação dos escravos.
Esta guerra deixou marcas até hoje, que foram sendo esbatidas pelo tempo e pelo estatuto de superpotência entretanto conquistado.
Mas eis que, actualmente, os problemas económicos, financeiros e políticos são de tal monta, que estão a abrir brechas no todo, com petições a correrem em muitos estados contra o governo federal, algumas pedindo a independência.
A ficção pode sempre tornar-se realidade e, como diz o povo, cá se fazem cá se pagam…
*****
Vem tudo isto a propósito do que se vem passando na Catalunha.
A Catalunha pertenceu ao antigo Reino de Aragão, que foi uma média potência no século XV, e que se uniu a Castela através do casamento dos respectivos monarcas, Fernando e Isabel, em 1469. De seguida aqueles que viriam a ter o título de «Reis Católicos», juntaram forças para a conquista do Reino de Granada, formando-se deste modo a actual Espanha, em 1492.
E assim se tem mantido apesar da grande revolta entre 1640 e 1652, revolta esta que permitiu aos portugueses sacudirem o jugo Filipino e voltar a terem uma dinastia nacional, a partir do 1.º dia de Dezembro de 1640 – data que o actual governo, parceiros sociais e PR querem, estupidamente, anular da lista dos feriados nacionais, quiçá da memória colectiva.
As feridas voltaram a abrir-se durante a Guerra Civil de Espanha (1936-1939), entretanto suturadas à força, pela Falange de Franco, mas não saradas.[1]
Os fantasmas da independência voltaram a surgir nos últimos anos e a crise financeira só os agudizou.
Vai ser um problema bicudo que os povos da Espanha vão ter que resolver, de preferência sem derramamento de sangue.
Sendo um problema interno espanhol, o mesmo pode internacionalizar-se num ápice, como acontece quando qualquer problema possa ferir interesses de outras potências, independentemente dos «belos» princípios do Direito Internacional, entretanto proclamados ao ímpeto dos «ventos da História», sempre soprados por quem goza do poder real, à época.
O que fere os sentidos, no caso vertente, é a impudicícia e o tom leviano e displicente como é tratado pela comunicação social e nos meios políticos, um tema dos mais relevantes, como é o caso da soberania das nações.
Dito de outro modo, discute-se, na praça pública, temas fundamentais da nossa existência como se estivéssemos a combinar uma ida ao cinema…
Outra coisa que impressiona é ver que a maioria da argumentação pró e contra a independência ter a ver com a solução política que garanta um melhor nível de bens materiais.
Então uma Nação e uma Pátria esgotam-se nisso? Tudo se resume a uma página de um (mau) contabilista, do «deve e do haver»? E se a situação reverter, muda-se outra vez de camisola?
Tem sido baseado nisto, aliás, que muitas parvoíces têm sido ditas e feitas, entre nós, sobretudo relativamente à «Região Autónoma da Madeira», e à argumentação idiota de muitos compatriotas, ao exalarem da boca para fora que «não se importarem de serem espanhóis, pois lá vive-se melhor».
Já se esqueceram, certamente, que nos anos 40 e 50 do século XX, os «Manolos» andavam de alpergatas e com um cordel a fazer de cinto, e que o escudo valia duas pesetas até perto de 1974… Já deviam ter aprendido que os «fumos da Índia» são efémeros!
De facto as sociedades andam profundamente doentes e desequilibradas.
Substituir Cristo na Cruz, pelo cifrão da Wall Street, dá nisto. Como já tinha dado o deserto frio e árido do «Materialismo Dialético», e como continua a dar a tentativa de substituir todos os Deuses pelo «Supremo Arquiteto»…
Não estando em causa o princípio da «Autodeterminação dos Povos» (que, recorda-se, nenhum governo português, até hoje, pôs em causa) não se pode, também, negar à restante Espanha o direito de se opor aos desígnios catalães.
A situação está longe de ser simples e pacífica, e para qualquer lado para onde nos viremos só se vislumbra um enormíssimo «saco de gatos».
Em primeiro lugar a Espanha corre o risco de se partir toda, o que não é nada despiciendo de considerar. Depois temos que a Constituição Espanhola, naturalmente, proíbe separatismos. O Rei e os militares juraram a Constituição (presume-se que as cabeças dos restantes órgãos de soberania, idem).
O Rei «comanda» os militares (não é bem como cá); apesar de ser uma história (ainda) mal contada, foi Juan Carlos quem meteu os blindados de Milan del Bosch de novo nos quarteis.
É claro, que nos tempos que correm, já quase ninguém arrisca morrer por causas, mas estas coisas vão e voltam. Fiquemos por aqui.
Internacionalmente é igualmente complicada a situação. Em primeiro lugar a nível da NATO e da UE. A confusão seria mais que muita e, certamente, que a Espanha vetaria a entrada da «nova» Catalunha, nestas organizações.
A UE, por seu lado, tem muitas responsabilidades neste estado de coisas, por via do esbatimento de fronteiras, da tentativa de amalgamento das gentes, da «Europa das Regiões», das negociações directas com Bruxelas, etc.. A partir do Tratado de Maastricht e do «Euro», o «Politburo» europeu lançou os países aderentes num movimento uniformemente acelerado rumo ao desastre e á implosão!
E até pode acontecer que a Catalunha se transforme numa espécie de Covadonga ao contrário, isto é, local de início da reconquista muçulmana do «Al Andaluz».
De facto a Catalunha tem a 3.ª maior percentagem de emigrantes muçulmanos da Europa, depois da França e da Bélgica. E tem localidades onde essa percentagem sobe aos 40%. São já cerca de 450 000, ou seja 6% do total. E a maioria deles pertence ao ramo fundamentalista «Salafita» que defende essa reconquista, e apoia a independência…
Numa perspectiva mais alargada, convém lembrarmo-nos que o antigo Reino de Aragão não se confinava à Península Ibérica, entrava pelo sul de França (Aquitânia e Midi Pirenéus). Ora não estamos a ver a França, que já tem o problema do País Basco e da Córsega, teve três guerras com a Alemanha, com a questão da Alsácia Lorena sempre presente e tem outras potenciais zonas de fractura, a olhar para uma eventual independência da Catalunha de ânimo leve.
Do Reino de Aragão fizeram parte ainda as Baleares e a Comunidade Valenciana, hoje regiões autónomas (são 19…). Estas manter-se-ão assim ou quererão integrar um novo país?
Já agora, os antigos Reinos de Nápoles e das Duas Sicílias também foram Aragão durante muito tempo. Ficarão imunes? Aqui a questão será mais pacífica, mas o Estado Italiano, em pré bancarrota e com potenciais acções de secessão nas fronteiras do Norte, ficará tranquilo?
Quem aparenta estar tranquilo é o Estado Português, «no passa nada»!
Só tem olhos, ouvidos e narizes para a «Troika». Anda de trela curta.
A esmagadora maioria da população tem dificuldade em se aperceber o que se passa, habituada (e anestesiada) que está a espreitar a «casa dos segredos» e empenhada nos eventos futebolísticos, que de nacional já quase não têm nada a não ser as dívidas.
Começou agora a vir para a rua, em desespero, gritar que lhe estão a ir ao bolso, depois de três décadas em que lhes calaram a consciência com «subsídios» emprestados, férias e eletrodomésticos a cartão de plástico e muita demagogia, a troco de votos…
O Governo continua, alegremente, a desmantelar os pilares da Soberania, sobretudo o mais importante de todos que é a Instituição Militar (parou um pouco nas polícias pois tem as barbas a arder).
E o Senhor Ministro para a tropa, perdão, da Defesa, anda empolgado em fazer acordos de defesa com a Espanha (com ou sem a Catalunha?)…
Para além dos problemas económicos que daí advirão, existem dois grandes perigos para o nosso país resultantes de um conflito na Catalunha: evitar que os «cacos» venham parar ao lado de cá da fronteira (recorde-se novamente a Guerra Civil de Espanha); e precaver-nos contra uma eventual tentativa de cobrança compensatória, relativamente a Portugal, como já aconteceu noutras crises do passado – Olivença também foi vítima disso – nomeadamente na sequela da Guerra de 1898, já citada.
A questão do contágio do exemplo para o nosso país não parece crível – apesar de tudo, a atitude do Dr. Jardim e dos seus sequazes, não passa de uma chantagem barata e de mau gosto, mesmo assim, inadmissível.
Portugal é o Estado–Nação mais coeso e perfeito, em todo o mundo e sempre exportou o seu modo de ser para todo o mundo onde arribou e só se foi desintegrando por acções externas.
Mas, cuidados e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.
O Mundo foi sempre um local perigoso.
E tem dias piores 
[1] Outros marcos que merecem referência são a perda completa da autonomia da Catalunha, em 1714, na sequência da Guerra da Sucessão de Espanha e o renascimento moderno da autonomia política, no final do século XIX através do «Movimento Renaixença», onde pontificou Francesc Cambó.