quinta-feira, 15 de março de 2012

Ordem de serviço no Tribunal de Viana do Castelo interdita
a utilização da nova grafia


Um juiz do tribunal de Viana do Castelo emitiu uma ordem de serviço proibindo a utilização da grafia do novo Acordo Ortográfico, alegando que os tribunais não estão abrangidos pela resolução do Governo.
A decisão do juiz Rui Estrela Oliveira consta de uma ordem de serviço datada de 23 de Janeiro deste ano e aplica-se a todos os processos e tramitações do segundo Juízo Civil daquele tribunal, sendo justificada pelo próprio, em entrevista à Agência Lusa, como uma «questão eminentemente jurídica».
O juiz recorda a resolução do Conselho de Ministros de Dezembro de 2010, que «determina que, a partir de 1 de Janeiro de 2012, o Governo e todos os serviços, organismos e entidades sujeitos aos poderes de direção, superintendência e tutela do Governo aplicam a grafia do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa», para concluir: «Esta antecipação de efeitos não engloba os tribunais, porque não fazem parte do Governo. Não são superintendidos, não são dirigidos nem são tutelados pelo Governo». Este é o primeiro motivo para não aplicar o Acordo Ortográfico.
Interpretação jurídica
Paralelamente, a «preocupação» deste juiz, plasmada na ordem de serviço, vai ainda mais longe e chega à própria interpretação jurídica de textos, conforme a aplicação da nova ou da antiga grafia, dando forma ao segundo motivo.
«Se há campo onde há mais mudanças, na intensidade de utilização de certas palavras, é no Direito. Pode provocar, com o mesmo texto, um sentido totalmente diferente. Isto nunca foi pensado nem acautelado de nenhum modo. Juridicamente é muito importante o que se diz e o modo como se diz», afirma ainda o juiz.
Aponta como exemplo uma construção da sua autoria, envolvendo «corretores» da bolsa e a função de «corrector», esta pela antiga grafia.
«De início, o corretor da sala 3 assumia a função de corretor do corretor da sala 2, para depois passar a ser o corretor de todos, até do corretor da última sala que, confrontado com a situação, esboçou um sorriso», apontou o juiz, para logo depois concluir: «Uma vez que corrector perdeu o 'c', o sentido é indecifrável».
Quebra de liberdade
O que o leva ao encontro do terceiro motivo para não aplicar o Acordo Ortográfico. «Alguém que está a escrever, se se apercebe disto, não vai escrever. E aí há uma quebra da sua liberdade», garante, assumindo ainda a possibilidade de, com a nova grafia, poder haver «uma situação em que o Tribunal não é entendido na sua ordem», sobretudo por quem apenas aprendeu uma grafia em toda a vida.
Por outro lado, este juiz entende que a aplicação do novo Acordo Ortográfico ainda «não entrou em vigor na ordem jurídica portuguesa», classificando a antecipação da sua aplicação como "um bocadinho forçada, tendo em conta as características do Direito".
«À partida, o prazo de adaptação deve ser o mais longo possível para os tribunais», afirma o juiz Rui Estrela Oliveira, reconhecendo um dos efeitos da sua decisão: «Agradecimentos dos advogados. Fundamentalmente isso».  

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